SAÚDE| 10.10.2023
“Existem pessoas que comentam que fazem terapia e isto é um grande avanço”
Entrevista com o Psiquiatra Luis Rojas Marcos
Ele é um grande defensor dos benefícios de falar, até para si mesmo. Também de manter relações sociais de qualidade, de ajudar outras pessoas e de ter um estilo de vida saudável por meio de exercícios físicos e alimentação. Essas são algumas das dicas do psiquiatra espanhol Luis Rojas Marcos para ser mais felizes e viver anos com qualidade.
Vital e sorridente. Este é Luis Rojas Marcos, que acaba de chegar à “Grande Maçã” em Nova York, seu lugar de residência há 55 anos. O psiquiatra espanhol, que acaba de completar 80 anos, reconhece que continua muito ativo, embora sem um horário de trabalho, o que lhe permite conciliar o ensino universitário com a medicina, a escrita, o coaching e a pesquisa, fundamentais para continuar contribuindo para o bem-estar das pessoas.
Conversamos com ele no Dia Mundial da Saúde Mental para conhecer os segredos para cuidar de nossas emoções e melhorar nossa qualidade de vida.
Datas como a de hoje nos lembram de que a saúde é chave para construir uma vida plena e satisfatória. Como define uma pessoa com boa saúde mental?
Ter saúde mental significa, principalmente, aceitar a si mesmo e aceitar os outros, sentindo-se satisfeito com a vida em geral. É importante lembrar isso em dias como hoje, quando o destaque está em um direito humano universal, que proporciona bem-estar, segurança, tranquilidade e paz, e que, sem dúvida, contribui para conscientizar à sociedade de que viver e conviver vale a pena.
A pesquisa está avançando?
Nos últimos 50 anos, os avanços na saúde mental foram muito significativos, não apenas no diagnóstico e tratamento de doenças, mas também na melhoria do bem-estar emocional da população. Mas precisamos continuar trabalhando no estigma que marca o doente, que ainda representa uma barreira que impede muitas pessoas de consultar um profissional por considerar isso um sinal de fraqueza. Em Nova York, por exemplo, há pessoas que comentam que fazem terapia e isso, sem dúvida, é um grande sinal de que estamos progredindo.
Em seus livros, você defende a importância de falar.
Sempre defendo que falar para se comunicar ou desabafar é muito saudável e terapêutico, e falar bem consigo mesmo protege a autoestima e contribui para o nosso bem-estar. Está comprovado que pessoas extrovertidas não apenas têm uma melhor qualidade de vida, como também vivem mais. As mulheres espanholas, por exemplo, têm a segunda maior expectativa de vida do mundo, com uma média de 86 anos. Não consigo resistir à conclusão de que elas vivem mais porque falam mais.
A solidão é a nova pandemia silenciosa. Como ela afeta a saúde mental? O que podemos fazer combatê-la?
Há uma diferença entre estar sozinho e sentir-se sozinho. Tanto o isolamento social quanto o sentimento de solidão afetam a saúde mental e física e aumentam a mortalidade. Podemos nos sentir sozinhos mesmo quando estamos rodeados de pessoas e esse sentimento tem um impacto muito significativo em nosso estado de espírito. É nesse ponto que entramos no mundo da depressão que, na minha opinião, é a doença mais prejudicial que podemos sofrer, pois ela nos rouba a esperança, a força natural que sustenta a ilusão e a motivação para viver. É por isso que o suicídio é a sequela mais amarga desta doença. Quando nos deparamos com uma situação de isolamento e solidão em alguém ao nosso redor, a primeira coisa a fazer é confirmar que estamos diante desse problema e, em seguida, assumir o centro de controle e preparar nosso plano de ação.
Muitos de nós respondemos automaticamente com um “tudo bem” quando nos perguntam como estamos, sem reconhecer abertamente que podemos estar passando por um momento difícil. Deveríamos ser mais honestos? Isso poderia nos ajudaria a gerenciar melhor nossas emoções?
Não há dúvida de que, em muitos países, a pergunta é utilizada como uma saudação educada e não exige maiores detalhes, o que nos permite manter uma distância cautelosa. A predisposição para compartilhar temas pessoais é condicionada por nossa personalidade e pelos costumes de nosso ambiente social. De qualquer forma, expressar com palavras as sensações que nos incomodam é uma estratégia protetora eficaz. Não apenas desabafamos, mas ao compartilhá-las, nos abrimos para o apoio solidário e as tornamos mais suportáveis. Verbalizar nosso desconforto geralmente é o primeiro passo no caminho para gerenciar nossas emoções. Em certas culturas, como a dos Estados Unidos, em que o bem-estar é idealizado como sucesso pessoal, reclamar de dificuldades emocionais em ambientes sociais costuma implicar fracasso. Portanto, há uma relutância perceptível em compartilhar estados de preocupação ou desassossego.
O que podemos fazer para prevenir doenças mentais?
Acredito que fornecer informações claras e confiáveis é fundamental, pois nos protege dos sentimentos de desamparo e incerteza, que nos causam tanta ansiedade. É nesse ponto que os profissionais da saúde e as instituições têm um papel muito importante, mas também os meios de comunicação e os formadores de opinião.
Talvez precisemos adotar a filosofia do “aqui e agora”
Charles Darwin, em sua obra “A expressão das emoções no homem e nos animais” (1872), conta que um dia perguntou a um garotinho o significado da felicidade. A criança respondeu “rir, falar e beijar”. Acho que seria difícil oferecer uma definição mais palpável do que é o bem-estar do aqui e agora.
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