INOVAÇÃO| 15.02.2023
Venture capital platforms: apoiar o empreendedor mais além do dinheiro
Os fundos de capital de risco estão criando plataformas para pôr à disposição de suas startups participantes, além de capital, os conhecimentos, especialistas e redes de contatos necessárias para acelerar seu crescimento.
Tudo começa com uma ideia mas, para poder desenvolvê-la, escalá-la e que ela acabe sendo um sucesso, são precisos, além de muito trabalho, recursos. Em muitas ocasiões, o financiamento é buscado em fundos de capital de risco ou venture capital (VC, sua sigla em inglês), que investem em startups procurando rentabilidades financeiras maiores.
2021 foi um ano recorde de investimento em startups na Espanha, superando os 4,2 bilhões de euros. Neste ano de 2022, apesar da complexa situação macroeconômica, um investimento de mais de 3,365 bilhões de euros teve lugar, uma redução de 843 milhões de euros a menos. No entanto, estes fundos são cada vez mais conscientes de que o dinheiro é só um pontapé para alavancar um projeto. Proporcionando assessoria, experiência, contatos, talento ou especialistas, estas venture capital conseguem acelerar o sucesso de suas empresas.
É uma coisa que as gestoras de fundos já vinham fazendo, mas agora está se consolidando sob o termo ‘platform’, que contempla estruturas que procuram dar um serviço integral a seus projetos e nutri-los com um conhecimento, licenças ou talento que não têm por que ter incorporado dentro da empresa.
Nos últimos dois anos, em um contexto de baixas taxas de juros, o mercado do capital de risco recebeu uma inundação de liquidez. Isto fez com que as startups, diferentemente de em outras épocas com um contexto macroeconômico diferente, fossem estimadas por muitos investidores e vissem-se na posição de escolher os mais atraentes. “Na hora de escolher um investidor, as startups baseiam-se principalmente em dois critérios. O primeiro tem a ver com a liquidez, isto é, a possibilidade de que o fundo possa investir em sucessivas rodadas de financiamento e, portanto, acompanhar durante mais tempo a startup”, sustenta Joan Cuscó, diretor global de Transformação da MAPFRE. “O segundo critério está mais vinculado ao prestígio do próprio fundo, seu posicionamento no mercado e as capacidades que põe à disposição da startup para conseguir clientes, talento, conhecimento e novos investidores”.
O fundo de capital risco pan-europeu Samaipata, criado pelos empreendedores José del Barrio e Eduardo Díez-Hochleitner, sabe o quão importante é dedicar tempo e recursos, não só econômicos, a suas empresas. Samaipata investe em rodadas early stage de plataformas digitais –SaaS, marketplaces e plataformas B2B y B2C– com efeitos de rede. Em 2020 começou a lançar seu segundo fundo, desta vez de 110 milhões de euros.
Uma startup, diz Marcia Maciel, chefe da Founder Success Platform deste venture capital, é um projeto que acarreta um risco onde “muitas coisas têm de sair bem para conseguir lançar um mercado, produto ou tecnologia”. Maciel sustenta que esse suporte econômico é “primordial”, mas um bom investidor pode fazer muito mais coisas para aumentar as probabilidades de sucesso de um projeto”. Por isso, afirma, é de vital importância que os fundadores destas empresas possam acessar a uma rede de apoio que abranja desde uma coisa tão simples como um contato, ao acesso a um novo serviço ou a busca de talento.
Apesar de que todos os projetos têm suas forças e fraquezas particulares, sobretudo nas primeiras etapas, Maciel assinala um erro bastante comum: às vezes, conseguir capital parece um fim em si mesmo. “Isto nunca é assim, o capital é um meio para construir e para escalar, mas a criação de valor reside no produto ou serviço da startup e em sua capacidade de levá-lo ao mercado e vender”, conta.
The Hive, a colmeia da Samaipata para apoiar a seus projetos
Como defendem, o capital não é o único meio para construir. Este VC criou The Hive, que já se converteu em uma referência entre as Plataformas a nível internacional. Trata-se de um projeto 360 que procura conectar o capital humano através de uma comunidade de fundadores e stakeholders. “Mediante esta iniciativa, preparada pela equipe da Founder Success, comprometemo-nos a apoiar e empoderar estes empreendedores de diferentes maneiras ao longo da viagem. Por exemplo, através da The Hive, ajudamos-lhes a atrair talento, estruturar as seguintes rodadas de investimento ou a escalar suas operações”, afirma a Samaipata.
“Também pomos à disposição dos empreendedores uma série de ativos exclusivos: nossa rede de Operating Partners (especialistas de mercado), um extenso portfolio de alianças com prestadores de serviços de primeiro nível, workshops ad hoc para equipes de executivos das empresas envolvidas e uma extensa rede de players do ecossistema”, conta a chefe da Founder Success Platform.
“Em The Hive sempre estamos experimentando novas iniciativas e projetos que gerem um grande impacto nas empresas de nosso portfolio. Para isso, contamos com uma equipe supercomprometida e com os melhores especialistas da indústria em nossa comunidade. Estamos sempre alinhados com a estratégia das empresas envolvidas e suas prioridades, o que nos garante um acompanhamento mais efetivo e dinâmico”, sustenta.
“Samaipata Operating Partners e os ex-alunos da The Hive apoiaram-nos desde o nosso investimento inicial até a Série A, facilitando projetos de infraestrutura central a partir da configuração de nosso DataStack até a reavaliação de esquemas de incentivos para nossa equipe comercial” — William Hoyer, fundador e CCO da Geomiq.
Entre seus dois fundos, Samaipata investiu em 28 grandes empresas e conseguiu uma arrecadação de 400 milhões, com dois resultados bem-sucedidos: Deporvillage, uma loja on-line de roupa esportiva, e FoodChéri, um restaurante virtual com cozinha própria que prepara comida fresca para entrega a domicílio. Seus tickets vão desde 500.000 até os 2 milhões de euros e entre sua carteira encontram-se empresas com Matera, Legl, Colvin, Fintecture ou Retraced.
Mundi Ventures e uma equipe exclusiva de Plataforma
Da mesma forma, Mundi Ventures, liderada por Javier Santiso, põe em evidência aqueles projetos de base tecnológica que se encontram em uma early stage, que contam com modelos de negócio B2B e que se encontram em séries A ou B de financiamento. Este ano lançou seu segundo fundo especializado no setor insurtech com um objetivo de 250 milhões de euros, do qual a MAPFRE é investidor âncora. Desde que o primeiro fundo Insurtech foi lançado há três anos, Alma Mundi Insurtech analisou mais de 2.500 propostas que se traduziram em 40 investimentos. Entre seus casos de êxito, encontram-se a ferramenta de inteligência artificial para o investimento sustentável Clarity AI, ou a plataforma para preparar o atendimento domiciliar das pessoas idosas, Cuideo.
“A rede de sócios foi uma grande vantagem para crescer mais rápido, contratar as melhores pessoas e selecionar sócios locais estratégicos” — Tim Dumain, cofundador e CEO da Bigblue
Na hora de escolher sua carteira de projetos, a gestora de fundos de capital de risco Mundi Ventures evidencia aqueles que tenham uma base tecnológica, que sejam escaláveis a grande velocidade e que tenham um impacto global. “Procuramos, principalmente, que estejam liderados por uma equipe de primeira categoria que seja capaz de executar um projeto internacional de grande alcance”, sustenta Lluis Viñas, diretor de investimentos da Mundi Ventures. Concentramo-nos nesses projetos que estejam liderando a transformação da indústria [seguradora]”.
Suporte em ESG, finança ou vendas
Quando se apoia uma empresa, consegue-se capital para crescer, podendo entrar no Conselho, mas também essa experiência que agora se engloba sob o termo ‘platform’. “Na Espanha, somos os primeiros a construir uma equipe de Plataforma para dar suporte às startups mais além do dinheiro”. Dele fazem parte uma pessoa dedicada a ESG (meio ambiente, social e governança, sua sigla em inglês), um especialista em finanças, outro em desenvolvimento de negócio e outra pessoa para o cumprimento regulatório.
A importância de apoiar essas startups em termos de conhecimento, indica o diretor de investimentos da Mundi Ventures, reside no fato de que “muitas vezes estas empresas têm planos de negócio muito ambiciosos que requerem um foco de 200% na execução. Isto é, dedica-se muito tempo a realizar o plano de negócio e, às vezes, custa ganhar perspectiva”, afirma. “Nós como investidores temos uma posição mais global e podemos oferecer este tipo de talento que talvez uma startup não pense que precise nesse instante. Com esta equipe oferecemos um talento que eles não têm incorporado e do qual se podem servir para preparar-se para a fase seguinte em um ou dois anos”, conta Lluis Viñas.
Para ilustrar isso, o diretor da Mundi Ventures refere-se a um caso de êxito de um de seus projetos, do qual não divulga o nome por razões de confidencialidade. Trata-se de uma empresa que começa a trabalhar em um plano de crescimento não orgânico dentro de seu setor, com o objetivo de adquirir pequenos negócios não digitais, digitalizá-los, e integrá-los dentro de sua atividade. “Esta empresa não tinha experiência neste tipo de crescimento, assim que nosso especialista em análise financeira ajudou a estruturar todo o processo”, sustenta.
Em outros casos, exemplifica, a pessoa da Plataforma especialista em desenvolvimento de negócio pode apoiar a uma empresa, por exemplo, ajudando a contratar um diretor de crescimento ou estruturando os planos de venda.
KFund: arrecadação de fundos, busca de clientes e talento
Da mesma forma que a Mundi Ventures ou Samaipata, outras venture capital estão seguindo estratégias similares, como KFund que, com tickets que oscilam entre os 50.000 e os 10 milhões de euros, impulsionaram o êxito de empresas como Fatorial, Goin, Exoticca o Abacum e contam com um portfolio que ronda os 60 projetos. “Nós gostamos de investir em empresas onde a tecnologia seja o motor do negócio. Concentramo-nos especialmente naquelas que dão um uso novo e interessante à inteligência artificial, a computação quântica ou a ciência de dados. Além disso, procuramos pessoas que resolvam problemas em mercados realmente grandes”, afirma seu chefe de Plataforma, Max Bray.
Bray indica que os três pilares fundamentais de apoio às startups são a ajuda na arrecadação de fundos, a busca de clientes e contratar as pessoas adequadas. “Determinamos quais são os objetivos desse negócio a ser realizado nos próximos 12 a 18 meses e depois trabalhamos ativamente com eles para compreender suas necessidades. Assim, ajudamos a startup a achar o talento adequado através de recrutadores. “Além disso, temos uma grande base de dados com contatos muito diversos. Cada vez que fazemos um investimento, perguntamo-nos como os podemos ajudar de forma personalizada, vamos à nossa base de dados e podemos proporcionar-lhes clientes e contatos de todo tipo”, conclui Bray.
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