INOVAÇÃO| 12.03.2024
Viver com neurodivergência: quando o empreendimento social surge para gerar um impacto positivo nas famílias
Viver com neurodivergência não é tarefa fácil para as famílias. Além das necessidades sanitárias, há muito mais: educativas, comportamentais, econômicas… A sociedade não termina de estar preparada para estas novas demandas. Neste contexto, surge Blue Hug, um ponto de encontro para pais com filhos e filhas neurodivergentes que se apoia no conceito de empreendimento social.
Conforme o British Medical Bulletin, aproximadamente entre 15 e 20% da população global é considerada neurodiversa. O que se esconde por trás deste termo? A neurodivergência refere-se a pessoas cujas funções neurológicas diferem do que é considerado típico ou médio e abrange uma ampla gama de condições.
Os diagnósticos frequentemente associados à neurodivergência abrangem o Transtorno do Espectro Autista (TEA), o Transtorno por Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), a Dislexia, a Dispraxia ou Transtorno do Desenvolvimento da Coordenação e os Transtornos de Processamento Sensorial. O leque é muito amplo.
Embora até a década de 90 a neurodiversidade fosse um conceito desconhecido, a verdade é que a sociedade atual é cada vez mais sensível ao diagnóstico, tratamento e inclusão destes grupos: há um maior reconhecimento das diferenças neurológicas e um aumento da consciência pública.
Neste contexto, a pesquisa sobre a neurodivergência é essencial para entender melhor as diferentes formas de funcionamento do cérebro e melhorar a vida daqueles que apresentam estas características, visando uma maior aceitação e desestigmatização. Mas adaptar a sociedade às necessidades específicas da neurodiversidade representa um desafio: são necessários esforços conjuntos para integrar práticas inclusivas em todos os âmbitos possíveis, desde a educação até o ambiente de trabalho, passando pela saúde e pela própria vida familiar.
Que implicações tem no lar um bebê neurodivergente
Contar com um filho ou filha neurodivergente na família requer uma adaptação nas rotinas – em maior ou menor medida, dependendo das necessidades específicas do diagnóstico – e a comunicação para atender às suas necessidades.
Estima-se que em torno de um em cada cinco ou seis bebês sofrem variações no desenvolvimento do seu cérebro (entre elas, autismo, dislexia ou ADHD). Esta realidade produz um profundo impacto na família em diferentes âmbitos: econômico, educativo, atendimento sanitário… Por exemplo, as famílias sabem que não é incomum receber uma ligação da escola a qualquer hora do dia para informar um problema específico. Este tipo de chamada implica que o progenitor deve abandonar seu posto de trabalho durante a jornada de trabalho, com o qual o impacto transcende o escolar e entra totalmente no terreno da conciliação.
Outro tanto acontece com o que diz respeito aos padrões de família: a "normalidade" de um sistema familiar deixa de fora aqueles que contam com membros neurodivergentes. Neste sentido, o momento da temida "volta à escola" é significativamente estressante para as famílias com este tipo de casuísticas: 94% deles reconhece que este retorno lhes produz "ansiedade e estresse". Além disso, os pais destacam que gerenciar a educação especial que os centros educacionais fornecem é complexa (horários, acompanhamento…).
Se entrarmos no campo do lazer, encontrar espaços seguros para todos os membros da família também não é tarefa simples. Se a diversidade de gostos também adicionar diversas necessidades, qualquer plano extraescolar ou de fim de semana pode ter uma logística mais complicada.
Tudo isso se traduz em múltiplos desafios que as famílias devem enfrentar. Os problemas de saúde mental por causa do estresse, das mudanças constantes nas dinâmicas ou de não ter os recursos necessários ao alcance para a gestão correta do diagnóstico e de tudo o que implica, entre outros, cobram seu preço, faltando, por exemplo, uma comunidade da qual ser participante e com a qual compartilhar vivências, positivas e negativas.
Empreendedorismo social, uma nova forma de responder a estas necessidades
Empresas e sociedade em geral estão cada vez mais conscientes de impactar de maneira positiva no ambiente. Um exemplo é a luta para reduzir a poluição e proteger o meio ambiente, mas também há projetos e compromissos públicos em outras áreas de alto impacto para as pessoas.
Nesta linha surge o que se conhece como empreendimento social, uma nova forma de responder às novas demandas sociais. Conhecida como a "criação de uma oportunidade de negócio que gere impacto e se concentre na solução de problemas sociais", é uma linha cada vez mais explorada, especialmente pelas gerações mais jovens ou por aquelas próximas às novas realidades.
Estes grupos veem nessas casuísticas áreas a explorar para transformar a realidade e deixar uma marca positiva nela. Por exemplo, a IE University, através de seu programa IE Impact, uma iniciativa projetada para desenvolver e empoderar líderes da mudança positiva, procura lançar luz sobre os estudantes em torno de alguns dos desafios mais complexos enfrentados pela humanidade e capacitá-los, cultivando uma mente empreendedora ao mesmo tempo em que se buscam soluções inovadoras para problemas existentes.
Blue Hug, um ponto de encontro para pais com filhos neurodivergentes
Neste ponto, no qual se encontram o empreendimento social e a importância de dar visibilidade à neurodivergência para buscar iniciativas que proporcionem uma pegada autêntica, surge a 'Blue Hug: Empowering Parents of Neurodivergent Children ’.
Nascido no seio do IE Impact, é descrito por seus criadores como "uma plataforma para ajudar e minimizar os problemas associados à neurodivergência, que reúne informação e torna esta mais acessível", e se dirige diretamente aos pais com bebês neurodivergentes. “Encontramos crianças isoladas que sofriam bullying na escola”, destacam as responsáveis por um projeto que “não se concentra nem nos pais/mães nem nos mais jovens, mas em criar uma comunidade na qual se possam compartilhar experiências”.
Assim, por exemplo, se uma mãe estiver em casa com seu filho autista em um dia de chuva, poderá recorrer à plataforma para ver quais planos pode realizar com base na experiência de outros pais. A Blue Hug não só integra pais com filhos neurodivergentes: também é composta por profissionais com experiência, bem como psicólogos, aos quais podem recorrer se desejar.
"Os pais e mães nesta situação tendem a se sentir muito sozinhos. Com esta plataforma queremos criar conexões próximas que gerem valor, principalmente quando mais necessitam", assinala este grupo de empreendedoras. “Blue Hug é sinônimo de acessibilidade e globalidade, tudo isso em um único espaço a partir do qual se pode acessar todos os recursos, planos e, é claro, a comunidade”, acrescentam.
O objetivo por trás deste projeto é claro: criar uma rede de apoio que os pais e mães tenham ao alcance da sua mão a qualquer momento e lugar. Trata-se de “chegar a essas famílias e uni-las, que sintam que não estão sozinhas e que não são as únicas”, sempre do ponto de vista de que “os problemas de solidão, inclusão, etc., são uma realidade” e essas famílias precisam se sentir empoderadas para fazer a melhor gestão possível da situação.
Definitivamente, a sociedade está começando a se preparar não só para dar visibilidade à neurodivergência, mas para ir um passo além em sua integração e propor soluções a algumas famílias que enfrentam uma situação complexa. Projetos de empreendimento social como Blue Hug são um claro exemplo do impacto positivo que podemos gerar nas novas realidades.
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