TECNOLOGIA | 01.06.2020
A matemática é capaz de mudar o futuro?
By Alvy (Microsiervos)
Kevin Systrom tem formação na área da computação e é milionário. É conhecido por ser um dos cofundadores do Instagram, empresa adquirida em 2012 pelo Facebook. Lá ele desenvolveu seu trabalho presidindo a companhia durante uma década até pouco mais de um ano atrás. Desde então, dedica-se a outros projetos, investindo principalmente em pequenas e novas empresas e aprendendo sobre diversos temas de seu interesse
Nos últimos meses, Kevin Systrom dedicou parte de seu tempo à aplicação de seus conhecimentos e experiência na análise dos dados públicos da pandemia pelo coronavírus (COVID-19). Sua abordagem, já aplicada no Instagram e em outros projetos há anos, mostra que a partir dos dados é possível aprender muitas coisas, desenvolver modelos matemáticos que expliquem e prevejam o futuro –inclusive partindo de dados imperfeitos– e especialmente como agir com esses dados. Ele define o projeto em uma frase:
“Se com um modelo matemático sobre determinado tema é possível estimar mil futuros possíveis, talvez seja possível saber que tipo de ações o levariam aos que mais lhe interessam.”
Em uma entrevista no podcast Recode, e especialmente em uma série de artigos, ele explicou todos os detalhes. Os artigos têm um perfil informativo, embora um pouco técnico; em parte se baseiam na matemática usada em áreas como a inteligência artificial. Começaram a ser publicados no dia 19 de março de 2020, havia somente 9 mil casos nos Estados Unidos e poucas vítimas:
- Predicting Coronavirus Cases (Como estimar os casos de coronavírus)
- The US just crossed a dangerous threshold (Os Estados Unidos cruzaram um limite perigoso)
- The Numbers Behind Social Distancing (Os números por trás do distanciamento social)
- The Metric We Need to Manage COVID-19 (A métrica necessária para gerenciar a COVID-19)
As fórmulas aplicadas por Kevin Systrom –que, antes de tudo, reconhece que não é epidemiologista– são as do chamado modelo SIR epidemiológico, que vemos os especialistas mencionar muitas vezes nas notícias. Esses modelos são versões
simplificadas do mundo real, no entanto, são úteis para analisar como uma epidemia se comporta. Suas siglas são resultado da divisão dos indivíduos de uma população em três grupos:
- (S) Suscetíveis
- (I) Infectados
- (R) Doentes
A evolução do grupo (por exemplo, em um país) varia com o passar do tempo, para cima e para baixo, e traça as famosas curvas em um diagrama, cujo aspecto também depende de duas variáveis: a taxa de transmissão e a taxa de recuperação.
A capacidade de influenciar no futuro
Kevin Systrom percebeu que variáveis como a taxa de transmissão se pareciam muito com as que definem o crescimento dos apps e dos conteúdos nas redes sociais: se 100 pessoas instalarem um aplicativo no lançamento ao mercado, e cada uma convencer outras duas a instalá-lo, logo haverá 200, e então 400, 800, 1.600 etc. o que, por semelhança, é conhecido como “efeito viral”. É um crescimento exponencial, mais ou menos acentuado, de acordo com algumas variáveis numéricas importantes bem definidas. Quando mudam, essas variáveis produzem efeitos, como os famosos «achatar a curva» ou «dobrar o pico».
Quando nesses modelos matemáticos são utilizados, os dados reais que vão sendo obtidos ao longo do tempo, observa-se uma grande capacidade preditiva. No caso da COVID-19, isso se ajusta bastante, pois há grandes quantidades de informações e, além de tudo, bem detalhadas. De fato, Kevin Systrom esperava estar enganado, porque o modelo inicial indicava números altíssimos para os poucos dados existentes dos Estados Unidos. Infelizmente, o tempo mostrou que ele estava certo. Também ficou claro que esses fatores não são os mesmos para cada país por diversas razões complicadas.
Mas o mais interessante é que esses modelos podem ser aperfeiçoados com mais detalhes, as chamadas intervenções, entre elas e no caso da COVID-19:
- Manter o distanciamento social
- Usar máscaras
- Manter a população de uma cidade em confinamento
- Limitar a mobilidade em carros, transporte público ou aviões
Muitos países utilizaram essas estratégias ou intervenções para agir contra os efeitos da doença e tentar voltar à normalidade o mais rápido possível. Kevin Systrom faz uma comparação com o que acontece após incluir uma nova função ou um botão extra em um aplicativo: estudando os dados é fácil avaliar em poucos dias se foi uma decisão boa ou ruim.
A confiança na ciência
Para muitas pessoas é difícil confiar em algo frio como dados, tabelas de números, fórmulas e modelos matemáticos. Mas é a melhor ferramenta à disposição dos epidemiologistas para tentar definir o que pode acontecer no futuro. Assim que novos dados sobre os fatores importantes (taxa de transmissão, capacidade hospitalar, taxas de recuperação, mortalidade etc.) são recebidos, é possível incluí-los e, em seguida, agir.
Além disso, devido à grande quantidade de dados disponíveis, qualquer pessoa, em princípio, pode “escolher seu próprio futuro”: uma pessoa pode saber o risco de sair de casa ou ficar em casa; a probabilidade de ser infectado em um encontro com um grupo de duas, dez ou cem pessoas. Até uma empresa pode estimar a probabilidade de uma pessoa infectada entrar na loja, dependendo do “momento marcado na curva”.
É uma fonte de esperança saber que a intervenção humana pode ter grande influência no futuro de uma pandemia. Embora os modelos considerem que variáveis como a taxa de transmissão são estáticas, é algo que depende do comportamento das pessoas. A atitude das pessoas, as medidas sanitárias e as políticas governamentais podem reduzir o risco, produzindo um efeito drástico no resultado. Com todas essas informações, isso serve como um estímulo maior para que todos respeitem as medidas e ajam de maneira coordenada em uma situação que afeta a todos.
___Foto: (CC) Cristopher Michel @Wikimedia