ECONOMIA| 11.05.2022
Riscos em alta: o que proporcionará o segundo trimestre à economia global
A guerra na Ucrânia, iniciada em 24 de fevereiro, alavancou o risco geopolítico ao mesmo tempo que alentou outros riscos que estiveram presentes nos dois últimos anos. Como consequência, vários possíveis detonantes apareceram no atual contexto, os quais poderiam resultar em uma indesejável recessão econômica.
A MAPFRE Economics, em seu último informe Panorama Econômico e Setorial 2022: Perspectivas para o segundo trimestre, examina que este novo condicionante geopolítico aprofundou o choque de oferta, apontando para “uma deterioração destacável a nível global de atividade e a um aumento das pressões sobre os preços”. A percepção de endurecimento da guerra provocou previsões de redução do crescimento pelo Serviço de Estudos, com um balanço de riscos em alta que evidencia as vulnerabilidades da economia global para os próximos meses.
- Dívida global
Após alcançar um novo máximo histórico global no primeiro semestre de 2021 (ao nível mais alto desde a II Guerra Mundial), a segunda metade do ano passado mostrou uma leve diminuição da dívida com relação ao PIB (ao registrar 351%) “graças a uma atividade econômica expansiva com taxas de inflação mais elevadas”. “Enquanto os mercados desenvolvidos tiveram um melhor desempenho (ao reduzir-se em 12,3 pontos percentuais), os países emergentes acumularam mais de 80% da nova carga da dívida”, acrescenta o dossiê.
À medida que as pressões inflacionárias se tornaram mais persistentes e a política monetária começou a mudar, o financiamento através de taxas de juros reais negativas poderia ir se diluindo, acompanhado, além disso, de um crescimento econômico menos robusto. Com isto, os especialistas afirmam que “a capacidade de coordenar políticas fiscais seletivas antecipa-se como um aspecto relevante para manter certo equilíbrio entre os stocks elevados atuais que limitam o potencial, os juros da dívida crescentes e a atividade econômica em baixa”.
- Política econômica
Assumindo níveis de inflação mais elevados do que o previsto e os efeitos da segunda rodada pelos preços das commodities, o risco de defasagem dos salários e, com isso, as perspectivas do nível de preços a longo prazo, impulsionaria o endurecimento monetário para uma etapa mais apressada do que o antecipado inicialmente.
Apesar de o cenário central da MAPFRE Economics continuar sendo o de um planejamento gradual, o risco de erro por parte dos bancos centrais poderia agravar-se “ao tratar de alcançar políticas neutras de forma um pouco mais afastada do consenso e sem tempo suficiente para avaliar os impactos não só nos preços, mas também no próprio crescimento econômico”. Neste sentido, o risco poderia ver-se exacerbado por “uma política fiscal em desacordo com a política monetária”, dada a potencial propensão para amortecer o shock atual com políticas fiscais expansivas, a retroalimentação de uma inflação que se aceleraria mais rapidamente e o risco de um impacto não antecipado (tanto do lado do desempenho econômico como dos mercados financeiros).
- Crise soberano-financeira na China
A incerteza no gigante asiático mantém-se à medida que os bloqueios pela política de Covid-Zero vão se estendendo por todo o país, aumentando os temores de uma desaceleração econômica, “expondo novas dificuldades pelo lado do consumo, impactos adicionais pelo lado da oferta e despertando os medos associados ao setor imobiliário”, explica o relatório.
O banco central chinês, por sua vez, continuou dotando à economia de condições financeiras mais frouxas e estimulando as exportações com o objetivo de dotar de certa estabilidade macroeconômica o país. Não obstante, apesar dos esforços do organismo para sustentar sua economia, a crise no mercado imobiliário continua sendo uma conta pendente.
Somado a isto, “o ambíguo posicionamento geopolítico em torno do conflito da Rússia e Ucrânia (cujo risco poderia desencadear em sanções internacionais que retomem a incerteza gerada durante a guerra comercial da época Trump) agravaria ainda mais a situação, “podendo desencadear uma crise de dívida com potencial sistêmico de contágio soberano-financeiro”, segundo o Serviço de Estudos.
- Mudança climática
Os conflitos da nova década não tinham separado a questão climática para um segundo plano. No entanto, os mais recentes avanços na questão da crise climática (através de um amplo quadro de políticas de consciência internacional após a COP-26 no final de 2021) viram-se ensombrecidos após a invasão da Rússia à Ucrânia, “ao colocar em evidência amplos problemas de segurança energética a nível global”, explica a MAPFRE Economics.
A disrupção nos fornecimentos de energia e outras matérias-primas supõe, conforme reconhece o informe Panorama, “um desafio adicional à trajetória de transição energética em todo o mundo, com especial relevância para o caso da União Europeia e seus planos de Gren New Deal.”
Apesar de esta crise poder gerar um impulso adicional para promover o investimento em energias limpas, estabelecer as bases de um projeto mais sólido e estender a visão de uma aceleração dos planos de desenvolvimento poderia, no curto prazo, requerer aumentos temporários intensivos em carbono. “Salvaguardar os interesses mais imediatos implicaria duplicar os esforços pela transição energética a médio e longo prazo”, destacam os especialistas.
- Covid-19
A crise epidemiológica está a caminho de ficar no passado (segundo o último relatório epidemiológico da Organização Mundial da Saúde (OMS). O número de novos casos e mortes por Covid-19 está diminuindo desde o final de março de 2022), mas voltou ao cenário de riscos na China, onde uma nova onda está obrigando seu governo a tomar medidas mais drásticas do que o previsto. A drástica tática de ‘Covid Zero’ terá, segundo estimam, “um alto custo econômico” para o país.
Fora da potência asiática, a paulatina volta à “normalidade”, sem deixar de prestar atenção às novas variantes e surtos, implica que “o risco epidemiológico deixou de ser o principal condicionante para os níveis de atividade, como aconteceu durante os dois últimos anos”, reconhece o Serviço de Estudos. Com isso, a opinião dos especialistas sobre as perspectivas futuras da pandemia está condicionada pela “aparição de novas variantes, sua virulência e transmissibilidade, e à efetividade das vacinas e antivirais contra elas”.
- Inflação
A escalada no nível de preços continua sendo uma preocupação para a grande maioria dos governos. As implicações atuais sobre o risco de inflação assentam-se sobre uma questão de origem na oferta, “com especial menção ao impacto direto do conflito Rússia-Ucrânia através do componente energético e de outros insumos que retroalimenta o problema inicial dos gargalos produzido pelas medidas implementadas para frear a Covid-19”.
Diante desta dinâmica, a função de resposta dos bancos centrais desembocaria em “políticas ortodoxas para a neutralidade monetária e, de maneira menos antecipada do que o previsto, para o terreno restritivo”, analisa o relatório. No caso de as medidas de política monetária serem insuficientes para que as expectativas de inflação sejam moderadas pelo lado da demanda, ou que o choque pelo lado da oferta voltasse mais persistente, isso conduziria, conforme afirmam os analistas, “um endurecimento ainda mais agressivo penalizando o consumo e a atividade econômica para evitar deslocamentos da inflação para termos estruturalmente mais elevados”.